18/12/2014



Bastam poucos minutos de conversa para sentir a paixão que Marquinhos, Marcos da Silva Fernandes, tem pelos cavalos. Tudo começou quando ele tinha apenas dois anos de idade e como diz a própria mãe, de uma maneira muito inexplicável. Pessoa sensível e reservada, Marquinhos tem uma carreira rica de histórias no hipismo clássico. Ele iniciou, na Hípica de Brasília, em uma época que os militares dominavam o esporte. Mudou-se para BH onde foi professor no Cepel e posteriormente no Chevals, que foi inaugurado há 15 anos contando com a experiência e colaboração dele. A convite do Romulo, proprietário da hípica, Marquinhos participou ativamente no projeto e quis dar importância maior a escola, que no Chevals tem nome de “Academia de Equitação.” Para isso ele também sugeriu que fossem adquiridos cavalos lindos, dóceis, de boa índole, com bom trato, que o material fosse de qualidade e que a escola tivesse lugar de destaque dentro da hípica.

 
 campeonato mineiro master 2012 - cepel  

 

Como amante de cavalos, ele acha que a maior qualidade que um aluno pode ter é gostar do cavalo e o momento em que ele se sente mais gratificado é quando consegue fazer com que um aluno faça bem feito o que é devido. Também se sente gratificado quando um aluno é campeão brasileiro pois sabemos o quão difícil é ganhar um campeonato de tamanha importância mas, segundo ele o mais importante, é quando ele sente que o aluno assimila os seus ensinamentos.

Como e quando o cavalo entrou na sua vida?

Minha mãe me fala que foi uma coisa meio inexplicável. Desde muito pequeno, quando tinha por volta de dois anos e meio, o leiteiro passava de carroça para entregar o leite e tocava a buzina. Minha mãe conta que não entende o porquê quando escutava a buzina eu ficava entusiasmado para ver o cavalo, porque não tinha ninguém da família que mexesse com cavalo. Meu primeiro contato foi com o cavalo da carroça. Como minha mãe viu que eu gostava muito de cavalo eu comecei a montar em uma chácara que nós tínhamos em Anápolis. A primeira vez que montei um cavalo de salto foi com um amigo, que era meu colega de sala. Ele tinha uma fazenda e nós íamos sempre para lá nos finais de semana. Quando o pai dele percebeu que estávamos interessados em saltar ele decidiu nos levar na Hípica de Brasília. Eu achei uma maravilha porque por muito tempo, para montar eu tinha que ir à fazenda e agora tinha uma hípica bem perto de casa. Nos meus 15 anos, ao invés de ir assistir a Copa do Mundo na Alemanha, preferi ganhar o título da Hípica de Brasília. Foi ai que comecei a praticar a equitação com o Coronel Fidelis que era presidente da Hípica. A equipe do Brasil, era composta por três militares e Nelson Pessoa por exemplo. Eu já tinha muita facilidade por que desde cedo montava muito em fazenda e sempre tive muita coragem. Com isso me desenvolvi muito rápido. Comecei a montar de 14 para 15 anos e com 18 anos eu já comecei a dar aula.

 

 
 DR. Aloisio Almeida de Castro (pai do Marcelo Artiaga) e o instrutor Hugo Vargas  

 

Tempo depois a Andrade Gutierrez fez o haras Pioneiro e me convidou para trabalhar. Foi meu primeiro trabalho de carteira assinada. Eles montaram um negócio muito profissional e com muito capricho. Começaram a importar cavalos e fiquei trabalhando lá.

Foi tranquilo para você ainda tão novo ter essa responsabilidade de dar aula, com todos os riscos que envolvem ser um instrutor no hipismo?

Para mim na época foi bem tranquilo. Não tinham muitas pessoas disponíveis porque só os militares que nos davam aula. As pessoas quando viam alguém já em um nível melhor, queriam que você as ensinassem porque não tinham acesso aos militares. Eu mesmo, para poder montar com o Coronel pegava carona com ele às seis horas da manhã. Ele me falava, “eu passo aqui ás 6 horas, se você não estiver você fica”. Eu tinha uma tia que morava comigo e dizia que as vezes eu tinha pesadelos e gritava pedindo para o Coronel me esperar.

 

 
Premiação do Dr. Marcos Mendes no Cepel  

 

Não me lembro de ter tido nenhum um tipo de dificuldade em dar aula. Naquela época eu não me preocupava tanto, por falta de opção e até mesmo pela falta de responsabilidade, mas eu não tinha medo de queda. Depois que ficamos mais velhos que pensamos na segurança e que alguém pode ser machucar.

Durante este tempo, você já participava de provas? Qual foi o campeonato que mais te marcou?

O primeiro campeonato que me marcou muito foi o primeiro brasileiro que participei em Campinas. Eu montava há apenas um ano. O Coronel me arrumou um cavalo mais velho, muito bom mas um cavalo pesado de boca e de perna . No Campeonato Brasiliense com menos de um ano que eu montava fui bem e por isso ele me colocou na turma do brasileiro, eu estava apavorado. Na prova de adaptação o cavalo saltou bem. No primeiro dia eu fui eliminado no primeiro obstáculo. Naquela época ainda eram três desobediências. Aquele momento ficou bem marcado porque não consegui saltar nem o primeiro obstáculo. Depois fui em um brasileiro em Porto Alegre. Eu estava com o braço quebrado e saltei de gesso e fiquei entre os 10 primeiros. Nós ficamos em um quartel e esta experiência foi muito boa e ficou marcada.

 

 
Fill D'Argent  

 

Como aconteceu sua mudança de Brasília para Belo Horizonte?

Em Brasília eu fui convidado para participar de um projeto da Secretaria de Educação pelo Coronel Perez Cavalcanti que foi o maior vencedor de CCE. E o Major com quem eu montava era um dos responsáveis pelo projeto. O projeto era para ir para as Olimpíadas de 84 na modalidade de CCE. Eu não conhecia muito esta modalidade mas como era um projeto olímpico eu fiquei animado. Comecei a treinar no regimento de cavalaria. Nos primeiros treinos sofri um acidente com um cavalo puro sangue inglês que se chamava Lobo e tinha sido doado pela Gama Filho. Ele ia muito bem nas provas de salto, era um cavalo espetacular, mas no primeiro cross que eu fui fazer , no obstáculo número três, que era um piano, ele chegou no obstáculo e quando viu a água, ao invés dele saltar no primeiro lance ele foi pro direto pro segundo e bateu a cabeça no terceiro quebrando toda a cara e ali mesmo ele foi sacrificado. Para mim aquilo foi muito traumático. Eu gosto muito dos cavalos e ele era muito bom todos falavam que se ele fosse as Olimpíadas, ele iria fazer bonito no salto. Com este acidente eu pedi um tempo do projeto. Nesta época Dr. Marcos Mendes, do Cepel, foi a Brasília para um CSN e convidou eu e o Vitor para montar os cavalos dele. Depois de uns oito meses ele nos convidou para vir para BH. Não fiquei muito animado com a proposta mas foi a oportunidade que tive no momento de começar a trabalhar algo que meu pai já me cobrava, principalmente por ser único filho homem. Transferi minha faculdade de direito para BH mas acabei largando por não conseguir conciliar os horários. Com o tempo foram vindo os primeiros alunos como Fernando Diniz e outros.

 

 
- Ruban Bleu 2.10  

 

Qual animal foi o mais importante para você?

Foi a minha primeira égua que comprei do Coronel Cirilo, a Ruban Bleu. Ele iniciou a égua no CCE. Quem montava a égua era o irmão do Vitor e depois eu comecei a monta-la. Eu falei com ele que se um dia ele fosse vender eu tinha interesse em comprar e assim aconteceu. Foi com ela que comecei a pular as provas mais importantes. Fui vice campeão na primeira Copa Cepel e comecei a saltar provas de potencia que eram muito comuns naquela época. Eram três dias de prova sendo no primeiro dia prova de caça (quando a falta reverte em tempo), no segundo potencia e no ultimo um grande premio. Como ela não era muito rápida, eu a poupava no primeiro dia porque ela era muito boa em potencia por ser corajosa e ter muita força. Ela me ajudou a sobressair. Fui recordista mineiro saltando com ela 2.20m. Ganhei também no Rio saltando 2.10m. Saltei várias provas sempre acima de 1.90m e ficávamos sempre entre os três primeiros colocados.

Por quanto tempo você ficou com ela?

Lá na Europa, começaram achar que as provas de potencia machucavam os animais e eles começaram a diminuir essas provas. Por um lado foi bom, porque ela passou a se sair melhor nos grandes prêmios. Por ela não ficar mais tão brava, porque não tinham mais as provas de potencia, comecei a criar uma regularidade com ela nos grandes prêmios. Ela foi campeã na inauguração da pista de grama do Cepel. Na semana seguinte fui a um concurso do Parque de Brasília e fui vice campeão no Grande Premio.

Era um ano Olímpico e comecei bem nas seletivas. Um dia treinando, ela sangrou o nariz e aspirou tendo assim efizema pulmonar. Depois disto, perdi a égua e uma grande chance pois mesmo indo bem nas duas seletivas tive que aposenta-la. Foi um animal que me deu uma projeção muito grande.

Outro cavalo que me projetou muito foi o Atthak Z. Dr. Marcos comprou este cavalo do Nelson Pessoa, ele tinha 6 anos e o Vitor começou a monta-lo. Ele era um cavalo novo e garanhão e o Vitor saltava com ele as provas de 1.20 sempre fazendo alguma falta. O Vitor era uma pessoa muito competitiva e entrava nas provas para correr sem ter a preocupação se o cavalo estava pronto ou não. Assim ele passou o cavalo para mim. Um cavalo com um potencial enorme. Eu comecei a entrar com ele nas provas sem a preocupação com o resultado e ele começou a fazer zero e foi subindo de altura. Com isso, ele virou um cavalo Olímpico. A última prova que pulei com ele, foi de potencia com cinco verticais no picadeiro coberto no aniversário de Santo Amaro. A primeira vertical com 1.50m e a ultima com 1.90m. Foi uma das vitórias mais marcantes que já tive, não sei se pela facilidade que foi ou pela beleza da prova. Cheguei na final com Marcelo Artiaga com um cavalo do Império Egipcio que tinha sido bronze no Pan-Americano e Doda com Ipiranga que foi o primeiro cavalo importante dele nas provas mais altas. Doda foi o primeiro e fez duas faltas, depois veio o Marcelo que levou refugo no último obstáculo. Nunca me esqueço do momento que fiz a curva para o ultimo obstáculo de 1.90m. Qualquer cavalo hoje que eu for para saltar uma vertical de 1.40m, não me dará a tranquilidade e confiança que ele me deu no 1.90m. Depois ele voltou para o Vitor.

Você acha que todos os cavalos são capazes de se enquadrarem na categoria de cavalos novos, ou alguns serão mais lentos no aprendizado e não conseguirão estar na altura estipulada para a idade?

Eu sempre gostei muito de montar cavalos novos. O cavalo novo pode comparado com um ser humano – pois cada um tem seu tempo de evolução. E um cavalo, acredite se quiser, te mostra se está ou não pronto. Você tem que ter sentir o que ele te passa a cada momento. Um cavalo de quatro anos, já tem que saltar 1.10 sendo que as pessoas começam a montar este mesmo animal com três anos e meio. O ideal é que você trabalhe este cavalo um ano começando com 0,90m , 1,00m para quando o cavalo for fazer cinco anos ele estar no 1.10m.

Quais desafios você vive no seu cotidiano com seus alunos?

O maior desafio hoje é tentar fazer com que eles entendam que o mais importante não é a altura. Eu vejo que no hipismo, o mais valorizado é a altura que você salta. Procuro então passar para eles e para os pais que é mais importante fazer bem feito. É tão bom quando um aluno consegue fazer até um simples exercício de varinha bem feito, é uma motivação muito grande. Eu quero muito que uma pessoa vendo alguém na pista fale: “eu não conheço esta pessoa, mas tenho certeza que é aluno do Marquinhos.” Quero que eles façam uma pista bem feita e que aquele momento seja de prazeroso e tranquilo e não um stress. Alguns alunos eu consigo mas outros não aceitam.

Quando um aluno insiste em subir de altura mesmo não estando preparado, o que você faz?

Falo que não está preparado mas se ele quiser, nós vamos tentar e vou torcer para dar certo e eu estar errado.

Quais são as características mais importantes em um atleta?

Para o atleta de hipismo é gostar do cavalo. É primordial. O cavalo é seu parceiro, quando você gosta dele, você irá entender que ele tem um dia bom mas também um dia ruim. Irá entender que ele tem limitações e assim fica mais fácil para você formar um bom conjunto.

 
   



Como a sua esposa e filhos entendem o seu ritmo de trabalho?

Me sinto privilegiado porque a Daniela entende. Sei que ela já estava mais ou menos preparada para isso. Sinto falta deles porque não tenho final de semana nem feriado. Ela é muito importante porque mostra para os meninos que minha dedicação ao trabalho é para o bem deles.

Meu pai...

Na minha época a relação com os pais era mais distante e tínhamos muito mais respeito do que a geração de hoje. Mas mesmo distante ele me deu todos os exemplos de honestidade, de ser um homem trabalhador, de educação...

Minha mãe...

Ela sempre foi a pessoa mais importante d a minha vida. Me apoiou e sempre esteve ao meu lado em todas as decisões e momentos difíceis. Ela é um exemplo de bondade, simplicidade, humildade, caridade, educação e de uma fé muito grande. A mãe que todos sonhamos em ter.

 

Cavalo mais importante - A minha primeira égua Ruban Bleu

Primeiro professor - Assis

Comida predileta – Camarão provençal do Taste Vin

Cidade – Belo Horizonte

 

MODALIDADES

SALTO

A modalidade Salto consiste...
A modalidade Salto consiste basicamente numa prova em que o conjunto (cavalo/cavaleiro) percorre um percurso entre 8 a 12 obstáculos diferentes.

ENDURO

Palavra de origem inglesa, o Enduro...
Palavra de origem inglesa, o Enduro (Endurance) se traduz como competição longa em que a velocidade deve se adequar à resistência.

ADESTRAMENTO

O Adestramento ou Dressage, como é...
O Adestramento ou Dressage, como é conhecido internacionalmente, é uma modalidade Olímpica do Hipismo.

CCE

O Concurso Completo de Equitação...
O Concurso Completo de Equitação (CCE) é uma modalidade olímpica também conhecida como o “triatlon” equestre.